Certamente você já leu a esse respeito no noticiário automotivo nos últimos dias: o Salão do Automóvel teve o predomínio das fabricantes chinesas. Tá bom, eu sei, novidade zero. Mas gostaria de insistir no tema, com a licença poética de que trabalho para uma delas. E não há por que esconder isso. São somente verdades e interpretações que independem dos nomes dos meus clientes.
Sete anos depois, o Salão do Automóvel de São Paulo abriu as portas no último dia 22 com atrações completamente diferentes daquelas da última edição, lá no longínquo 2018. Historicamente, o Salão sempre exibiu a pujança das marcas instaladas no Brasil, com estandes nababescos das grandes. Nem nababesco, nem simplório: Volkswagen, General Motors e Ford nem foram ao Salão 2025.
A mostra trazia os carrões importados, de marcas de luxo e esportivas, como cerejas do bolo, como atrativos para chamar público. Mas o espírito do Salão era exibir as novidades das grandes marcas.

O que se viu a rodo nestes dias no Anhembi foi um desfile de novidades vindas da China. E, a despeito de você gostar ou não, é preciso ter maturidade para aceitar o óbvio: a comparação no número de novidades, lançamentos e até percepção de qualidade desses modelos foi infinitamente superior ao que se viu nos estandes das fabricantes tradicionais.
Salão de Shanghai?
Nada menos do que cinco novas marcas chinesas, cada qual com suas respectivas novidades: CAOA Changan (com sua família Avatr), Geely, MG, Denza e Leapmotor. E isso sem contar a GAC, que possui pouco mais de 6 meses de mercado.





Você teve Toyota lançando o Yaris Cross, de 122 cv, 4,31 metros de comprimento, na faixa de R$ 160 mil a R$ 190 mil. Aí você entra no estande ao lado e vê que, por R$ 5 mil a mais, você já adquire a versão de entrada de um Geely EX5 (híbrido), de 218 cv, e 4,61 m. Ou GAC GS4 (híbrido, também), de 235 cv e 4,68 m (R$ 192 mil). Ou ainda um Leapmotor C10, 100% elétrico, de 218 cv, 4,71 m e preço também na faixa dos R$ 190 mil.
OK, pode ser que nem todo mundo goste de carro grande, sei lá. Mas é um fato para se analisar. Os carros produzidos pelas marcas tradicionais estão caros frente aos chineses, numa comparação direta de carro por metro cúbico. O sucesso que já dura alguns anos de CAOA Chery, BYD e GWM é apenas o prenúncio do que está por vir.

Os números não mentem
Trago números, não só opiniões: em 2021, ainda sem os chineses, o Jeep Compass reinava absoluto em seu segmento. Fazia 5,9 mil unidades/mês. Hoje? 4,87 mil ao mês. Não parece uma perda tão grande. Mas é uma queda de 17,5% na média mensal de emplacamentos.




Adivinhe para onde foram esses compradores? O trio Tiggo7/BYD Song/Haval H6 vende, juntos, 8,5 mil unidades mensais. Observe: não é apenas o que o Compass perdeu, portanto; mas muito mais o que deixou de ganhar/vender!
Quer outro exemplo, ainda mais emblemático? Toyota Corolla. No mesmo ano da graça de 2021, ele fazia 3,5 mil vendas por mês. Ok, temos que considerar que o segmento de sedans médios vem sucumbindo aos suves. Mas hoje o líder vende 3 mil/mês. Com um fato novo: 1 mil unidades mensais, hoje, são de BYD King.


Prontos para venda
Se for ao Salão, experimente dar uma olhada, no estande da GAC, no GOVY AirCab, proposta de carro voador da marca chinesa que é 100% autônomo e, detalhe, já começa a ser entregue aos primeiros clientes chineses em 2026. Atenção: não é um conceito. É produto de série.
Assim como o Hyptec SSR, com seus 1.224 cv de potência, um dos únicos carros “sub-dois” (0 a 100 km/h em menos de 2 segundos) do mundo. Estão lá. Produtos produzidos em série. Ora, quem faz veículos com essa tecnologia agregada não teria competência para construir os suves de 200 mil reais?


Ou dê um pulo no estande da CAOA Changan e apenas olhe o interior dos carros e a proposta de cluster que eles têm! São nada menos que 35 polegadas de painel, posicionado sob a linha inferior do para-brisa. Rapaz! É lindo! E isso não gera valor? Se isso não é uma proposta premium, eu não sei mais o que pode ser.
Os carros dessa marca serão vendidos previsivelmente na faixa de R$ 500 mil, lá no segmento onde está a Zeekr. Se isso não se transforma em volume, como não deve se transformar mesmo, pelo menos agrega imagem ao produto, assim como à nacionalidade do fabricante.

Questão de imagem
Eu posso até não comprar um Changan Avatr 07 de meio milhão (sei lá se vai custar tudo isso…), mas minha percepção de valor agregado de marca passa a ser outra. Claro que cresce. E eu acabo comprando um carro de R$ 200 mil. É por isso que todas as novas marcas de automóveis, sendo chinesas ou não, começam sua jornada em qualquer mercado pelos produtos high-end.
Já contei essa história aqui: quando a Fiat lançou o Uno Turbo i.e., em 1994, entrevistei o presidente da marca na época, Pacifico Paoli, e critiquei o fato de que a frente passarinhava nas arrancadas.
![Fiat Uno Turbo [divulgação]](https://www.automaistv.com.br/wp-content/uploads/2024/09/fiat_uno_turbo_i.e._4-1320x791.webp)
Ele sorriu e disse que era proposital: “esse carro só tem 117 cv. Queríamos que ele desse uma sensação de que anda mais do que realmente anda. E, depois, sua função é ser carro de vitrine: ele fica lá, bonitão, no showroom, só chamando a atenção. E, no final, a gente vende Uno S e CS em cima da imagem dele”.
Premium é mais difícil
Os chineses vão ocupar todos os segmentos? Não, claro que não. Se você é uma marca premium, tenho a impressão de que seu filão estará resguardado por um bom tempo. Entendo que ainda há compradores de automóveis que buscam grife, status, ou pagam mais caro para ter algumas nuances de produto acentuadas. Nada substitui a tradição nesse aspecto.


Por exemplo: você paga xis a mais para ter o prazer ao dirigir uma BMW. Nada se compara a BMW nesse quesito. Ponto. Ou ainda desembolsa ipsilon a mais para ter a satisfação de olhar a estrelinha de três pontas no centro do volante do seu carro – nada se compara ao status da Mercedes-Benz. Ponto de novo.
Ou sonha desde criança com um Porsche e, quando tem poder aquisitivo para isso, vai lá e compra. Nada se compara à esportividade de um Porsche. Ponto final.

Só que o consumidor padrão, que é aquele brasileiro que adquire um suve para a família, e está olhando para as fabricantes nacionais como opções óbvias, talvez se importe menos com essas particularidades específicas. Repito: os três suves mais vendidos de marcas chinesas já somam 8,5 mil vendas mensais. E crescendo.
Quando a gente analisa as marcas generalistas (Volkswagen, Chevrolet, Ford, Nissan, Fiat, Renault, Peugeot, Citroën, Honda, Toyota etc), portanto, nota-se que cada vez menos consumidores estão verdadeiramente dispostos a continuar pagando mais caro por produtos menores e menos equipados.

E isso não é uma opinião. Vá ao Salão e veja por você mesmo. Vou repetir o que já disse na semana passada: esse negócio de trazer marca chinesa parece ser um negócio tão promissor, que até Stellantis (Leapmotor) e Renault (Geely) deram seu jeito…
Você foi ao Salão do Automóvel? O que achou? Conte pra gente.
![Leapmotor C10 REEV [divulgação]](https://www.automaistv.com.br/wp-content/uploads/2025/11/Leapmotor-C10-Ultra-Hibrido-REEV-14.webp)


