
Estendendo um pouco o que falei na semana passada sobre a notável capacidade do Fusca em enfrentar estradas enlameadas, numerosas na década de 1950, um dos motivos de sua pronta aceitação no mercado brasileiro, cabe explicar que sua mecânica era exatamente a mesma de um utilitário tipo jipe utilizado pelo exército alemão durante a guerra.
Esse utilitário se chamava Kübelwagen. Além disso, se no uso militar o motor arrefecido a ar era uma preocupação a menos, tanto no frio da Rússia quanto no calor escaldante dos desertos do norte da África, como El Alamein, num país tropical como o Brasil isso era indiscutivelmente um atrativo em si só, já que era comum carros com motor arrefecido a água superaquecerem, “ferverem”.
A construção do Volkswagen continuava com a velha receita de carroceria montada sobre chassi, apesar de já haver carros pequenos de carroceria monobloco, tecnologia mais moderna, como o Renault 4CV (foto abaixo), que também estava chegando ao Brasil junto com o Fusca.

Só que esse chassi era diferente do tipo mais conhecido, o de longarinas com travessas. No Fusca o chassi era tipo plataforma com túnel central, de excepcional rigidez, sobre o qual a carroceria era aparafusada, formando um conjunto de grande solidez, a qual era logo percebida por quem o dirigisse, e isso agradava e muito.
Fora esse aspecto, o projetista Ferdinand Porsche viu na construção separada a possibilidade evidente de usar qualquer carroceria sobre esse chassi, como foi o caso do utilitário militar citado. Na vida comercial do Fusca era possível substituir o chassi em caso de acidente, o que levou a custos de reparação menores, o que interessava tanto aos proprietários quanto às seguradoras.

Outro ponto favorável ao Fusca era ter os quatro para-lamas aparafusados à carroceria em vez de soldados, facilitando e barateando os reparos dos pequenos acidentes.
Já falado, os elementos elásticos da suspensão do Fusca — as molas — eram por torção e não por flexão, frágeis na época, mais uma vez significando robustez, fama que não tardou a se estabelecer. E além da robustez o rodar do Fusca era macio e a suspensão independente nas quatro rodas contribuía em grande parte para o conforto de marcha.

Ao volante do Fusca
Dirigir o Fusca era mesmo divertido. Devido ao motor e câmbio traseiros sua a direção era bem leve e, portanto, podia ser rápida, poucas voltas de batente a batente. O câmbio de quatro marchas, mesmo sem ter a primeira sincronizada, era muito fácil de usar e absolutamente preciso (a primeira receberia sincronização em 1961).
O Fusca tinha particularidades interessantes. O pedal do acelerador não o tradicional de superfície plana. Ele consistia de uma pequena roda, era estranho, porém era mais fácil de pressionar do que um pedal de acelerador de formato tradicional.

Não havia medidor da quantidade de gasolina no tanque, tampouco a régua graduada que vinha com o carro nos primeiros anos na Alemanha para olhar o nível do combustível. A maneira encontrada pela fábrica para evitar que o motorista ficasse sem combustível, situação sempre embaraçosa e inconveniente, foi colocar uma torneira no anteparo que separa a cabine do porta-malas.
A torneira tinha três posições Fechado, Aberto e Reserva. A torneira era operada por uma pequena alavanca feita com o pé direito (ou pé esquerdo nos modelos de volante na direita).
![VW Fusca Itamar [divulgação]](https://uploads.automaistv.com.br/2024/02/volkswagen_fusca_36-1320x791.jpg)
Quando restavam cinco litros no tanque de 40 litros o motor dava sinal de estar sem combustível, com o quê o motorista, com o pé, colocava a torneira na posição Reserva, o motor logo voltava a funcionar normalmente e o veículo podia rodar 50 quilômetros até um posto. O único cuidado era, após reabastece, voltar a torneira para Aberto para restabelecer a Reserva. Era o mesmo sistema adotado nas motocicletas por décadas até o ano 2000, quando passaram a ser dotadas de medidor de combustível.
Eram soluções que tornavam um carro, diferente, exclusivo, mas sobretudo atraente, fazendo coro com suas características ímpares de projeto e design. Como na época conta-giros era instrumento de carros especiais e caros, a fábrica teve o cuidado de colocar marcas na escala do velocímetro para orientar o motorista quando passar para a marcha superior. Eram três marcas em algarismos romanos: I 20 km/h, II 35 km/h, III 70 km/h.

Era um carro minimalista, mas tinha detalhes que agradavam muito, como bancos revestidos de casimira e as partes baixas do interior revestidas com um material fibroso claro de ótima aparência e resistência.
Na parte externa, frisos diversos e para-choques cromados lhe conferiam um atraente efeito-joia, capaz de dar orgulho ao seu proprietário ou proprietária. Apesar do minimalismo o Fusca trazia um equipamento da maior comodidade, o aquecimento da cabine.

O resultado não poderia ser outro, aqui e mundo a fora. De julho de 1945 a julho de 2003 — 58 anos — foi produzido um total de 21.529.464 de unidades, recorde até hoje para carros de mesma configuração do dia que nasceu até deixar de ser produzido.
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