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Engenharia de emblema: como economizar para fazer um carro

Pense o seguinte: para que uma marca vai desenvolver um carro sozinha se ela pode pegar emprestado modelos das outras e colocar seu emblema?

Skoda Citigo, Volkswagen up! e Seat Mii [Divulgação / Montagem: Maurício Garcia]
Skoda Citigo, Volkswagen up! e Seat Mii [Divulgação / Montagem: Maurício Garcia]

Como economizar tempo, muito dinheiro e ter pouco esforço para desenvolver um carro novo? Simples: pegue emprestado o modelo de uma concorrente sua ou de outra marca do grupo. Pode até parecer gambiarra (às vezes é), mas essa cultura tem um nome: engenharia de emblema.

Nesse especial com quatro matérias aqui no Auto+ que será publicado toda quarta-feira 12h, vamos mergulhar no universo dos carros com emblemas trocados. Desde sua origem, tipos de engenharia de emblema, motivos pelos quais as montadoras fazem isso, até os casos mais famosos no Brasil e o carro que mais passou por engenharia de emblema na história.

Troca de logo

Trocando em miúdos, engenharia de emblema é quando uma fabricante pega o carro de outra e troca logotipos e nome e vende como se fosse seu. É como se, por exemplo, o sabão em pó fabricado pelo Omo fosse vendido pela Ypê usando somente sua embalagem. Ou se o Burguer King vendesse o Big Mac em seus restaurantes colocando um adesivo do BK na embalagem.

Isso é comum não somente no mundo dos carros, mas também em outros tipos de produtos fabricados. O exemplo do sabão em pó ocorre o tempo todo em mercados que possuem marcas próprias – ou você achou mesmo que o Carrefour tinha uma fábrica de sabão em pó? Eles simplesmente compram de marcas famosas, trocam a embalagem e pronto.

O primeiro caso de engenharia de emblema na indústria automotiva aconteceu bem cedo. Em 1926 a fabricante Nash lançou a marca Ajax como sua subsidiária de baixo custo. É como se fosse a Dacia da Renault. Depois de 22 mil Ajax vendidos em seu primeiro ano de mercado, a Nash achou que a ideia de separar as marcas era ruim e deu um passo para trás.

Nash Light Six / Ajax [divulgação]
Nash Light Six / Ajax [divulgação]
Paralisou a produção da fábrica por dois dias, trocou todos os emblemas Ajax por Nash e renomeou o carro como Nash Light Six. Kits de conversão foram vendidos às concessionárias para que os donos do Ajax pudessem transformar seus modelos em Nash. Ou seja, um carro que nasceu Ajax, se transformou em Nash um ano depois e até modelos usados poderiam se converter.

A situação foi bem além com a General Motors. Dona de diversas marcas, ela percebeu que poderia fabricar um mesmo carro base, modificando sutilmente detalhes para as marcas Chevrolet, Buick, Oldsmobile, Pontiac e Cadillac. Chegou ao ponto de que somente a grade mudava nos carros.

Engenharia de emblema nos carros da GM [divulgação]
Engenharia de emblema nos carros da GM [divulgação]

Tipos de engenharia de emblema

Depois de anos de mercado e diversos carros fabricados dessa maneira, hoje podemos dividir a engenharia de emblema em três vertentes: Preguiçosa, Disfarçada e Oculta. Não existe nenhum registro oficial desses termos, mas é algo que criamos aqui no Auto+ para facilitar a compreensão.

A engenharia de emblema Preguiçosa é a mais fácil de todas e bastante comum. É quando uma fabricante pega o carro de outra e simplesmente troca os logotipos. Exemplo mais notório e atual disso é o que acontece entre Toyota e Suzuki. Os carros da Suzuki na Índia são vendidos pela Toyota só com uma troca de logotipo, nomes e mais nada.

Quando a marca se esforça um pouco mais, pode até mudar a grade frontal e algum mísero detalhe de carroceria. Dodge Hornet e Alfa Romeo Tonale são belos exemplos disso. Os modelos são idênticos, encaixando peças de um em outro, mas o para-choque dianteiro muda um pouco, faróis tem parte interna diferente, mas o interior é perfeitamente igual.

O segundo nível é a engenharia de emblema Disfarçada. É quando você percebe que há semelhanças entre os carros, mas elas são disfarçadas por mudanças profundas na dianteira e traseira. O trio que abriu essa matéria é exatamente isso: Volkswagen up!, Skoda Citigo e Seat Mii tem o mesmo miolo e interior, mas frente e traseira bem diferentes.

Outro exemplo desse segundo nível de engenharia de emblema está em Ford Territory e Yusheng S330. As portas e painéis laterais dos SUVs são iguaizinhos, mas a dianteira, traseira e interior são completamente diferentes, não havendo sequer uma peça igual nessas áreas específicas. Exemplos mais brasileiros disso virão na segunda parte desse especial de matérias.

Por fim temos a engenharia de emblema Oculta, onde nenhuma peça de carroceria entre os carros é compartilhada. Só que toda plataforma e componentes escondidos são iguais. Isso resulta em carros com medidas idênticas, mesmo porte e comandos exatamente no mesmo lugar, mas com visual totalmente diferente.

Peugeot e Citroën são mestres em fazer isso: os antigos 208 e C3 eram um engenharia de emblema do outro, assim como C4 Lounge e 408. Hoje a Peugeot faz isso com a Opel, deixando o 208 atual um gêmeo não idêntico ao Corsa, tal qual o 308 é aparentado ao Astra. O mesmo ocorre constantemente entre modelos da VW, Skoda e Seat.

Para que fazer isso?

Muito se questiona sobre esse tipo de ação das montadoras – cheguei a ver pessoas nas redes sociais perguntando se a marca não seria processada por fazer engenharia de emblema. Mas não. É um acordo feito entre as duas partes e que beneficia a ambas as montadoras, em qualquer tipo de situação.

Quando estão no mesmo grupo, o custo de desenvolvimento dos modelos é diluído entre as marcas e as chances de vender mais unidades cresce. Usando como exemplo os subcompactos da Volkswagen: up!, Mii e Citigo. Se alguém não gosta da Seat, não precisa comprar o Mii, pode optar pelo Citigo. E se achar o Skoda feio, tem o up! como alternativa na VW.

São essencialmente o mesmo carro, mas o cliente pode optar por um modelo ou por outro por maior identificação com a marca ou por pura preferência visual. Isso se intensifica no caso de Peugeot 208 e Opel Corsa porque os modelos são muito diferentes e a Peugeot tem fama complicada em alguns países. No fim, o dinheiro vai para o cofre da Stellantis independentemente de que carro seja comprado, nesse caso.

Mas e quando as marcas não pertencem ao mesmo grupo? No caso de Toyota e Suzuki, é um benefício mútuo. A Toyota compra carros da Suzuki, garantindo vendas diretas de diversos modelos sem que, necessariamente, eles sejam comercializados a um consumidor.

Só que o caso das japonesas vai além. A Toyota não quer gastar desenvolvendo carros para a Índia, então pega prontos os da Suzuki e muda o logo. Já a Suzuki precisa de carros híbridos na Europa para baixar média de consumo e emissões de poluentes. Como não domina a tecnologia, pega pronto os modelos da Toyota.

Na próxima quarta-feira vamos conhecer os casos brasileiros de engenharia de emblema e como isso começou a se espalhar no nosso mercado.

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